Esses dias me deparei com um Keynote do CEO do Patreon, Jack Conte, que conseguiu resumir e explicar algo sobre o que eu estou falando e pensando há alguns anos: a nova fase da internet. Muitas pessoas estão sentindo a mudança, mas poucos conseguem entender de fato o que está acontecendo com os feeds e os seguidores. Com a entrada da inteligência artificial, finalmente as coisas começaram a ficar cada vez mais claras. Vamos ver se consigo expor algumas coisas e se você concorda?
Além de designer, eu também sou escritora e me lembro muito bem de quando ainda tinha uma conta no Instagram e fazia postagens de todo tipo para tentar vender os livros. Lembro que ficava muito decepcionada quando as postagens atingiam 200 ou 300 likes e alguns míseros 10 a 15 comentários. SIM! Isso, na época (2016), era um resultado medíocre. Hoje, um terço disso é considerado um sucesso moderado. Como isso aconteceu?
Vamos relembrar como era a web. A web 1.0 era basicamente uma versão “só para leitura” da internet. Olhando para trás, as pessoas chamam essa versão de web estática. Era onde você podia navegar por páginas e ler notícias, mas não havia uma maneira fácil para fazer upload e compartilhar as próprias ideias.
Então, no início dos anos 2000, uma série de novas empresas como o YouTube, Facebook e Twitter entraram em cena. O lema do YouTube era “Transmita Você Mesmo”. A ideia toda da web 2.0 era que, pela primeira vez, você podia participar da internet. Você podia postar, twittar, fazer upload, em vez de apenas ser um visitante.
Esse momento na história marcou uma mudança para a humanidade, especialmente para artistas e criadores. Porque, pela primeira vez na internet, era possível fazer mais do que apenas consumir. Você podia alcançar outras pessoas.
Se você era um músico naquela época e seus shows contavam com no máximo 50 pessoas, agora você podia alcançar milhares de pessoas colocando seus vídeos na internet de forma gratuita.
E aqui está um ponto crucial: você precisava criar para o seu público.
Mas a verdadeira beleza do YouTube era que ele tinha um botão de inscrição. Só é possível perceber o quão especial essa ideia foi em retrospecto, mas na minha opinião, esse conceito acabou sendo uma das coisas mais importantes sobre essa nova era da internet, o que as pessoas chamam de web 2.0.
O botão de inscrição foi fundamental. Ele transformou o YouTube de uma ferramenta para alcançar pessoas em uma maneira de alcançá-las e depois construir um público em torno do seu trabalho. O botão de inscrição permitia que pessoas que gostavam do seu trabalho se inscrevessem para ver mais no futuro, e isso criava um canal de distribuição para garantir que o seu trabalho futuro fosse visto.
A web 2.0 representou o nascimento do seguidor.Na minha opinião, o seguidor não é apenas um recurso prático de uma rede social. O seguidor faz parte da arquitetura fundamental para a criatividade humana.
O seguidor foi um sistema de organização para toda a internet. Ele fez parte de um framework para a distribuição da criatividade e comunicação, não apenas alcance, mas uma comunicação contínua.
Agora eu pergunto: quando se fala em seguidores na internet (seja qual for a plataforma), qual a primeira coisa que lhe vem à mente? Quanto mais, melhor? É isso?
Pois bem, já ouviu falar do Kevin Kelly, fundador da Wired? Ele escreveu um ensaio chamado “Mil Verdadeiros Fãs”, e sua premissa era simples: na era da internet, você não precisa de milhões de fãs para ter sucesso. Se você conseguir encontrar mil pessoas dispostas a gastar cem reais por ano no seu produto ou conteúdo, isso são 100 mil reais por ano, o que é um negócio lucrativo.
Ter fãs é diferente de apenas alcançar pessoas, é ainda mais profundo do que seguidores. São os superfãs, verdadeiros fãs. Chame do que quiser. A ideia é que existe esse grupo de pessoas que é o seu núcleo.
Se alcance significa que as pessoas veem, e seguidor significa que as pessoas querem ver mais, então verdadeiros fãs são as pessoas que compram seus produtos, baixam as músicas, pagam por cursos e todas essas coisas.
Voltando para a evolução da web, se pensarmos nos anos 90 como a web 1.0 e nos anos 2000 como a web 2.0, por volta dos anos 2010 uma nova mudança estava acontecendo. O Facebook começou a experimentar uma coisa nova chamada classificação. O que isso fez foi basicamente analisar cada postagem para determinar o quão envolvente ela era. Se não fosse suficientemente envolvente, o Facebook a empurrava para baixo no feed.
Ou seja, eles começaram a classificar ou ordenar as postagens de acordo com o que era melhor para o negócio deles. Isso foi ótimo para o Facebook, mas não para os criadores e seguidores. Isso começou a quebrar a ideia do seguidor, pois a conexão direta entre criador e fãs estava corrompida.
Isso também criou outro problema em torno da liberdade criativa. Agora, de repente, sua postagem precisa ser melhor do que as outras de acordo com um conjunto de critérios que você não conhece ou controla. Em vez de pensar no que você quer criar, agora precisa pensar em como o algoritmo de classificação vai reagir para poder “agradá-lo”, porque somente assim as pessoas serão alcançadas. É uma barreira adicional estúpida se pararmos para pensar nisso, e muda subconscientemente ou conscientemente a produção criativa para atender aos objetivos do Facebook e não do seguidor.
E se fosse apenas o Facebook fazendo isso, tudo bem, os criadores apenas postariam em outro lugar, mas então as outras plataformas tiveram que competir. O YouTube, o Twitter e o Instagram seguiram com feeds classificados em 2016. Eles saíram ganhando e nós (criadores e seguidores) saímos perdendo.
Vejo os anos 2010 como a década da classificação, a década em que a promessa original da comunidade de criadores foi quebrada pela primeira vez. Não quero entrar na grande discussão entre feeds cronológicos e algorítmicos. O problema é que se você vai mudar a maneira como organiza um feed, qual é o propósito por trás disso? Você está tentando criar um lugar onde possa construir relacionamentos sólidos entre marca e fã, onde seus usuários sejam inspirados a consumir e manter-se fieis ao longo do tempo e que tenham uma conexão direta com as marcas, ou está apenas maximizando a atenção e o tempo de visualização para mostrar o máximo de anúncios?
Infelizmente, por volta da virada da década, uma nova empresa chamada TikTok entrou em cena e teve um impacto muito mais profundo.Não era apenas o mar de vídeos curtos na vertical. O TikTok disse que queria criar o feed mais envolvente possível. Você pode seguir as pessoas, mas o conteúdo que será apresentado no seu feed não será necessariamente das pessoas que você segue. Funcionou, e o TikTok alcançou um bilhão de usuários até 2021. O tráfego na internet começou a se afastar das empresas de mídia social antigas em direção ao TikTok. Então, assim como aconteceu com o Facebook e sua classificação, as outras plataformas tiveram que competir. O YouTube lançou os Shorts, o Instagram lançou os Reels e o Twitter lançou o feed For You.
Dentro de poucos anos, todo o sistema de organização para a comunidade de criadores começou a desaparecer.
Como criadora, tenho sentido isso pessoalmente nos últimos cinco anos. Reduzi drasticamente minha participação nas redes sociais e algumas contas eliminei por completo. Menos é mais, menos é paz! Tem até camiseta com essa frase.
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Do meu ponto de vista, as redes sociais deixaram completamente de lado a ideia da conexão entre as marcas e seus seguidores. A meta agora é ganhar o máximo possível exibindo o máximo de anúncios para o maior número de pessoas no menor tempo possível.
Estamos na era em que você, seja criador ou seguidor, é a moeda de troca das redes sociais.
Está cada vez mais difícil alcançar as pessoas nos sites que se orgulham em dizer que contam com bilhões de usuários. Estranho, não é mesmo? Se você estiver apenas começando na jornada como criador e ficar parado segurando um banner no meio de uma rua pela qual passam de 100 a 200 pessoas por dia, tenho a impressão de que você vai alcançar mais pessoas naquele dia do que se tivesse postado várias vezes no mesmo dia em todas as plataformas. Mas isso é só um devaneio meu pessoal. Alguém poderia fazer esse experimento.
Não estou aqui para reclamar ou lamentar. Afinal, como criadora, estou sempre me adaptando e evoluindo. Mas é importante reconhecer o impacto dessas mudanças e como elas afetam não apenas os criadores, mas também os fãs e a comunidade em geral. Porque, no final das contas, tudo se resume a isso: a comunidade.
Hoje em dia, está mais difícil do que nunca alcançar as pessoas com um trabalho novo. É mais difícil construir uma comunidade, é mais difícil construir um negócio, é mais difícil manter a atenção dos seguidores.
O que está acontecendo é que estamos no meio de outra mudança, e esta é grande. Se os anos 90 foram a web 1, e os anos 2000 foram a web 2, e a década de 2010 foi dedicada ao ranking, prevejo que a década de 2020 possa se tornar o fim do seguidor para o algoritmo.
Estou vendo cada vez mais pessoas atualizando seus currículos porque não estão mais conseguindo alcançar os mesmos ganhos de antes graças às mudanças, e isso não está afetando apenas os criadores, está afetando qualquer pessoa que poste coisas na internet, está afetando empresas de mídia. Olhe para o que está acontecendo com o Vice, BuzzFeed e tantos outros. Esta é uma mudança realmente difícil de navegar para qualquer um que esteja criando conteúdo online e tentando construir sua comunidade ou seu negócio.
Acho muito importante estar ciente dessa mudança e entender que, se você não está se conectando tanto quanto gostaria com seu público, isso não significa que há algo de errado com você. Muitos de nós, como criadores, ficamos obcecados com o pensamento “O que posso fazer melhor?” e isso é um bom impulso, é uma mentalidade de crescimento.
Existem muitas pessoas inteligentes em grandes empresas, empresas de mídia bem financiadas, também tentando descobrir a solução, e elas também estão tendo dificuldades. Então, saiba que os resultados medíocres não necessariamente significam que há algo errado com você.
Acredito que este problema seja o mais importante que os criativos enfrentam hoje: o enfraquecimento das comunidades de criadores e nossos canais de distribuição para nossos fãs. O seguidor deixou de ter a importância que tinha para o algoritmo. Mas pessoalmente, não acredito que veremos o verdadeiro fim do seguidor. A próxima onda de tecnologia de internet e mídia vai abordar esse problema e tentar resolvê-lo.
Prevejo uma mudança fundamental na estratégia dos impulsionadores com foco em conexões mais profundas, em vez de apenas mais conexões. Os verdadeiros seguidores, os fãs, são os 5% que impulsionam 90% da comunidade e do negócio. O foco é o fã, não é o anúncio. É sobre profundidade de conexão, é sobre maximizar a fidelidade, é sobre fãs mais dedicados e inspirados. É isso que vai unir a nova onda de empresas emergentes, o foco estratégico delas estará no núcleo.
A próxima década de empresas de tecnologia criativa e de mídia se concentrará em construir conexões diretas com os fãs e na força da comunidade simplesmente porque o sucesso financeiro de cada uma delas vai depender disso.
Agora, como todos nós podemos nos preparar para essas mudanças?
A primeira coisa é: investir nesses verdadeiros fãs, investir na profundidade da conexão. Investir em pessoas, não apenas em novas visualizações, novos assinantes, tempo de exibição crescente para cima e para a direita. Trata-se de profundidade, qualidade de interação, encontrar aquela pequena porção de seus fãs que são o seu motor, que são seu núcleo, e depois descobrir como alcançá-los e reconquistá-los periodicamente (o que quer que isso signifique para você). Às vezes, quando falo sobre isso, os criadores pensam: “Isso significa, tipo, mensagens diretas, eu deveria estar conversando com fãs individuais?” Não necessariamente, não é isso que quero dizer. Quero dizer encontrar essas pessoas e construir conexões reais com elas, em qualquer capacidade que você tenha. Oferecer algo porque é genuinamente bom e não porque está na hora de alimentar o algoritmo.
Na minha experiência, investir no seu seguidor super fã e fazer com que ele se sinta visto e ouvido. Como fazer isso? Simples. Faça as coisas para ele, o fã. Vou explicar.
Há tanta pressão, especialmente agora, para fazer tudo para o algoritmo que virou piada. Crie para as pessoas e não para o algoritmo. Crie algo que você consumiria. É ridículo o fato de termos que nos lembrar que estamos criando para pessoas! Elas sentem quando fazemos algo que nos anima, algo com o que nos importamos ao invés de criar conteúdo apenas para “encher a linguiça do algoritmo”.
Uma das coisas que precisei relembrar, porque se perdeu em meio às tantas exigências dos algoritmos, foi: saber o que eu quero criar, quem eu sou e o que tenho para oferecer. Ao longo dos anos acabei perdendo a confiança naquilo que eu criava. Eu nem vi quando isso aconteceu. Se você abrir um vídeo de qualquer “guru” sobre marketing, eles vão começar falando em tudo o que o algoritmo exige antes mesmo de tocar no assunto “conheça e confie naquilo que você está oferecendo”.
Estamos na era onde tudo promete ser rápido, inclusive o sucesso. É tudo para amanhã. É a era da quantidade. Perdi a conta de quantas vezes vi influenciadores falando sobre “ser autêntico ou trazer algo novo e se destacar” em uma de suas postagens e em outra repetia feito um mantra que você “precisa seguir as tendências fazer o que já funciona para ter sucesso”.
O meu ponto é: não deixe que outra pessoa (ou plataforma) lhe diga o que você quer, porque então você acabará com o que eles querem em vez do que você quer. Acho que um bom exemplo disso é quando abrimos nossos painéis em alguma das plataformas e vemos essas métricas sobre o que é sucesso. É um painel que outra pessoa construiu para nós e ele nos diz o que queremos, e a coisa mais estranha é que, depois de alguns anos, começamos a acreditar que isso é o que queremos, nossas mentes são reprogramadas e acreditamos naqueles números, isso é sucesso, e perseguimos isso. Passamos a acreditar que visualizações e seguidores são sinônimos de sucesso. Mas não é bem assim.
Se voltássemos no tempo e perguntássemos ao Roberto Carlos o que ele queria, qual era o objetivo dele como artista, o que era importante para ele, você acha que ele teria dito que o objetivo dele como artista é “maximizar a quantidade de horas humanas gastas consumindo meu trabalho”? Não vou fingir que sei o que ele diria, mas tenho a impressão de que não chega nem perto de agradar algumas métricas em um painel. Ele teve seus motivos para ter se tornado um cantor. Tenho certeza de que nunca foi sobre algoritmos e sim sobre as pessoas. A conexão e consequente fidelização dos fãs e o conteúdo (música) criado por ele.
Eu sei o que eu quero. Quero fazer coisas atemporais, quero fazer coisas que pareçam verdadeiras agora e que pareçam verdadeiras em 50 anos ou até quando eu não estiver mais aqui. Por isso, escrevo livros. E muitos apoiam a ideia de que, se você quer sucesso tem que “dançar conforme a música”. Se é Natal, você cria conteúdo natalino. Se alguma música está fazendo sucesso, você usa essa música no seu vídeo para o algoritmo empurrar o seu conteúdo para mais pessoas. Concordo até certo ponto. Seguir tradições e comemorações não é o mesmo que seguir tendências fugazes.
Tenho a impressão de que hoje as pessoas esqueceram que elas têm o poder de pensar por conta própria. Elas querem que haja um Yoda, um líder ou um gerente, ou uma voz de autoridade que possa dizer o que elas devem querer porque é mais fácil assim.
Mas o que queremos vem intrinsecamente, não extrinsecamente, vem de dentro, é lá que encontramos o que realmente importa. Então, enquanto navegamos nesta próxima fase da internet como pessoas criativas, enquanto passamos por esses altos e baixos da web em seu estado sempre evoluindo, não esqueça o que importa para você, não esqueça o que te enche de orgulho, não esqueça seu propósito. Não esqueça por que você acorda de manhã e dedica os seus curtos anos neste planeta ao seu ofício.
Não deixe que as big-techs te confundam, que te façam acreditar que o que você quer é o que elas dizem o que você quer. Não é assim que o ser humano funciona.
Eu dei alguns passos para trás e redescobri quem sou como criadora. Percebi o quanto as redes sociais mudaram e eliminei mais da metade delas da minha vida.
Não escrevo para robôs. Não crio para algoritmos. Escrevo para você, humano. E repito, menos é paz.
Até a próxima.